... Esta é uma questão a que a maioria das pessoas não sabe responder com rigor.
Acredito no entanto que, apesar de a maior parte das pessoas não a saber definir correctamente, sabe identificá-la quando a vê ou sente.
A este propósito, vou partilhar agora consigo uma pequena história…
Eu nunca fiz parte daquele grupo de mulheres que arquiva no sótão, na garagem ou atrás da porta da casa de banho, uma imensidão de pares de sapatos e equiparados, que às vezes nem conseguem lembra-se daqueles que efectivamente têm. Gosto, no entanto, de ter os necessários e, acima de tudo, aqueles onde os meus pés se sintam confortáveis, o que, refira-se, não é fácil, especialmente em épocas em que se usam bicudos e estreitos e onde dificilmente entram pés como os meus (de plebeia).
Quando necessito de comprar um novo par, experimento sapatos e mais sapatos. As senhoras que me atendem esforçam-se (às vezes!!! …) por manter um sorriso mas, a pose cai totalmente quando, depois de experimentar dez pares digo: “Desculpe mas não vou levar, não gosto de os sentir no meu pé!...”
No verão passado fiz uma romaria deste género à procura de sandálias. Depois de percorrer n cidades e x, y e z sapatarias lá encontrei umas que me agradaram. A senhora da loja fez questão de me dizer que com aquelas sandálias parecia ter pé de princesa e que ela própria trazia umas iguais calçadas. Eram, segundo as suas palavras, super confortáveis e resistentes.
Comprei as sandálias plenamente convencida de que tinha feito uma grande aquisição.
Calcei-as no dia seguinte. A manhã correu normalmente e eu estava encantada com elas. Eram extremamente confortáveis e, de facto, o meu pé nem parecia meu... Mas este encanto foi sol de pouca dura. Quando regressava do almoço, à saída do restaurante, o salto de uma das sandálias partiu-se. Nem queria acreditar! Completamente novas!
Como a sapataria era distante peguei nas sandálias e levei-as ao sapateiro mais próximo.
Depois do seu conserto voltei a calçá-las. E eis que, novamente à hora de almoço (!!!), parte-se o salto da outra sandália. Se da primeira vez não queria acreditar, agora não sabia mesmo como expressar os meus sentimentos!...
De facto, eu não disse à vendedora que queria umas sandálias para trazer o dia inteiro ou cujo salto tivesse resistência suficiente para se poder fazer um pequeno percurso. Não me pareceu que fosse necessário. Está implícito, eu diria mesmo ser obrigatório, que um par de sandálias consiga resistir a passeios a pé por um período superior a um dia...
Eram de facto confortáveis e esteticamente muito agradáveis, mas não conseguiram responder ao que eu esperava delas, o que, no caso, nem sequer era nada de especial relativamente ao que qualquer pessoa exigirá quando compra um par de sandálias.
Resumindo: podiam ter várias qualidades mas não tinham qualidade, pois não respondiam às minhas “… expectativas … implícitas…” logo, para mim, não tinham Qualidade. "
A definição constante da NP EN ISO 9000:2015 vem confirmar o que acabo de dizer:
Qualidade: Grau de satisfação de requisitos dado por um conjunto de características intrínsecas de um objeto.
Se procurarmos na mesma Norma a definição de requisitos e características vamos encontrar:
Requisito: necessidade ou expetativa expressa, geralmente implícita ou obrigatória,
e
Característica: elemento diferenciador. | Objeto: Qualquer coisa percetível ou concebível.
donde:
Qualidade: Grau de satisfação de necessidades ou expetativas expressas, geralmente implícitas ou obrigatórias, dado por um conjunto de elementos diferenciadores intrínsecos de qualquer coisa percetível ou concebível.
Obviamente, o grau de satisfação referido na definição é o grau de satisfação do cliente. E será tanto maior quanto maior for o número de elementos diferenciadores intrínsecos ao produto ou serviço adquirido, que corresponda ou ultrapasse aquilo que o cliente esperava.
... Como já referi, gosto de comparar os Sistemas de Gestão da Qualidade e os seus requisitos com a vida.
Será que Qualidade é um conceito que se pode aplicar às relações amorosas? Será que existe uma forma de identificar se uma relação amorosa tem qualidade ou não?
... continua.
Lurdes Antunes, Qualidade para Principiantes 3ª edição, Edições Sílabo, 2019
Nota: Em Portugal, as Normas relativas a Sistemas de Gestão da Qualidade devem ser adquiridas junto do Instituto Português da Qualidade.